Os sem terra
Notem senhores o que acontece quando uma brincadeira das mais inocentes possíveis pode terminar como um grande mal entendido e este chegar a virar caso de polícia.
Aconteceu na Avenida Terezinha Pereira, mas antes de contar o caso, quero explicar os pormenores do ambiente em que este ocorreu, para que o leitor de todas as partes tenha uma visão clara da região, assim como os nativos de nossa cidade. Esta rua é composta por casas de um só lado da rua, o lado da sombra, o outro lado, o lado do sol, é inviável a construção de qualquer tipo de imóvel, já que se trata de uma várzea de aproximadamente
O caso foi que meu vizinho num certo domingo, com outros três amigos, num desses finais de semana prolongado de muita bebida e churrasco, resolveu fazer uma barraca em frente a sua casa para por a churrasqueira, como não podia fazer a barraca no meio da rua, claro, fez em frente a sua casa, porém na vargem, junto a um poste ali
A churrasqueira estava assando as preciosas costelinhas e alguns espetinhos feitos de lingüiça enquanto os quatro ali ao redor da churrasqueira e embaixo da barraca batiam um papo quando passa um senhor de bicicleta:
- E o que é? já tão fazendo casa na vargem?
Meu vizinho ironizou e respondeu na forma de brincadeira:
- jaaa, o prefeito liberou, quem quiser pegar um pedaço de terra é só marcar.
- Ah é? Ta certo!
O senhor de meia idade passou, olhando para trás e para a vargem, enquanto eles continuaram ali com o churrasco sem dar a mínima importância para a brincadeira. Ficaram até ao meio dia, terminado o churrasco meu vizinho foi descansar, pois no dia seguinte iria trabalhar bem cedo. Às quatro horas da tarde ainda do domingo meu vizinho levanta-se e sai pra ver como está à rua, como todos nós fazemos quando estamos em casa, nisso ele toma um susto, a vargem estava tomada por gente, ele sem saber do que se tratava, foi logo perguntando:
- O que é que esta acontecendo aí, em?
- Foi o prefeito que liberou a vargem, ele disse que quem pegar um pedaço de terra a prefeitura vai doar o material da casa.
Meu vizinho lembrou da barraca e da brincadeira dita ao senhor e não comentou mais nada, entrou pra dentro de casa e fechou a porta.
Na segunda feira bem cedo, a várzea estava tomada por paus, busca de coco, catemba, tonel velho, resto de concreto, resto de tijolos, sacos amarrados nas pontas das varas, enfim, a várzea de um dia para o outro, virou um verdadeiro lixão.
Todos os terrenos estavam sendo medidos a olho, aliás, a passadas, sete passos,
Aqui bem próximo de casa estavam dois sem terras medindo seus respectivos lotes:
- Viche, miudim os passos dele, meça o meu pedaço também!
Um pouco a frente estava outros:
- Ei você ai, só pode pegar
- Cê besta, esse é da minha irmã.
- Ah é assim, então vou pegar o da minha tia!
E lá ia medir outro lote.
- Ei esse pedaço ai não menino, esse pedaço aí é meu.
- Então marque, ora!
- Marco já, já. Estou esperando uma carroça de varas que mandei o menino tirar lá na Serra.
Em frente à casa de Zé Wilson estava um cidadão que mais parecia um guarda de transito, em pé, no meio da vargem.
- Esta fazendo o que aí seu Noel, feito uma estátua? Alguém perguntou.
- Pastorando meu pedaço enquanto os meninos vêm com uns galhos de mangue para marca esse lote.
Vejam só, até o mangue saiu prejudicado com essa brincadeira. Espero que o IBAMA seja logo comunicado, antes que alguém tenha a grande idéia de desmatá-lo para fazer casas.
Enquanto isso um senhor que tinha pegado um pedaço ali em frente ao bar do Canindé, não perdeu tempo, após cercá-lo com alguns pedaços de tocos e restos de arames farpados muito enferrujados, colocou uma placa de papelão com o anuncio feito à carvão:
VENDE–SE ESTE TERRENO.
Já em outro lugar estava uma senhora danada, parecia um “ciri numa lata”, reclamando das pessoas que estavam tirando as varas da sua cerca para levarem para a vargem:
- É só o que esta faltando mesmo, esses desocupados estão acabando com minha cerca, vou já é da parte!
As pessoas já começavam a se reunir para escolherem um representante para ir falar com o prefeito sobre os materiais da construção.
- E aí, quem é que vai avisar o prefeito que já esta tudo dividido?
- Sei não, mas ouvir dizer que ele vai fazer as casas em forma de mutirão!
- É mesmo é. Talvez ele deva começar lá pelo início da vargem!
Em outra parte dois senhores já estavam discutindo sobre seus respectivos projetos:
- Hei, quando é que vai começar a chegar a areia pra fazer o piso? Na minha só quero se for areia da boa, menino aqui vai levar areia, viu! Quando chegar à minha vez vou fazer-la bem alta, vou fazer com 14 fiadas de tijolos, quero nem saber!
- Assim que levantar a minha casa vou logo plantar dois pé de planta pra fazer sombra, qual é a planta que se pode plantar nesse terreno, em?
- Rapaz que eu saiba, aqui só dar mangue mesmo!
- Algaroba também da.
- Ah é.
Um senhor que pegou um lote nas mediações da Ticaca, aparentemente estava com um problema, mas já encontrara a solução.
- Viche, se começar lá pela rua de baixo vai demorar muito pra chegar na minha, acho que vou falar com o prefeito pra mim dar uma ordem do material que eu mesmo pego lá em Jorge e construo a minha.
Na segunda feira à tarde todo mundo estava animado falando de seus projetos quando chega o dono do terreno acompanhado do delegado da cidade com uma ordem, só que uma ordem de despejo:
- Todo mundo, prestem atenção; quem marcou esses terrenos façam o favor de agora mesmo tirarem os entulhos, um por um, e eu quero saber também quem inventou essa história que o prefeito autorizou a posse da vargem que eu quero dar-lhe um “chá” de cadeia no maldito!
Todos de cabeça baixa em silencio foram, um a um, tirando seus respectivos entulhos. Quanto a barraca, que permanecia intocável, o delegado questionou em voz alta:
- E essa barraca? Quem construiu essa barraca?
Meu vizinho que até então em silêncio prestava atenção ao desenrolar de todo processo de posse e desaposse respondeu com muita segurança e convicção;
- Não faço a menor idéia!
Então o delegado decretou:
- Derrubem essa barraca e ponha os destroços na caçamba pra ir pro lixão.
Meu vizinho após bater palmas disse para o delegado:
- Muito bem, é assim que se faz.
Na retirada do lixo da vargem, todos estavam indignados com aquela situação e entre os questionamentos e explicações o que mais se ouvia dos ex-proprietários das terras, era:
- Ah se eu pego o infeliz que inventou essa palhaçada!
Prof: Ronaldo Josino
4 Comentários:
Ronaldo quase morro de rir com essa história.
Mas saiba que foi verdade.
Ronaldo eu lembro dessa historia, mas não tão detalhada como você descreveu, ficou maravilhosa, bem detalhada. Esse fato revolucionou Grossos e ocurpada era seu visinho, depois quero saber quem é?
Hoje a rua Terezinha Pereira é considerada a rua do Lixão. Tá na hora do blogueiro começar a tirar fotos e publicar, só assim a municipalidade deixe de embolsar dinheiro e comece a trabalhar na melhoria dos que realmente se preocupam com o bem estar deles. Tá feito a crítica. Só espero que seja publicado.
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